Por
Alexandre Coslei
O Prêmio Jabuti, junto
com outras renomadas premiações da literatura, deveria criar uma categoria hors concours, a exemplo do que existia nos desfiles
de fantasias de luxo do Carnaval do Rio de Janeiro. Nomes como Chico Buarque,
Cristovão Tezza, dentre outros medalhões, já estão consagrados e não precisam
de mais espaço para divulgação. Ao se repetirem os mesmos nomes todos os anos,
os maiores concursos de literatura acabam subtraindo a chance de outros bons
autores, ainda desconhecidos, ganharem visibilidade.
Ouço
colegas afirmarem que não existe mercado editorial no Brasil. Não concordo. Ele
existe, apesar de precário e fundamentado em cima das vendas para setores do
governo. Um negócio que fatura bilhões não deve ser classificado como
inexistente. Também contamos com um público de leitores que, mesmo indicando
uma proporção capenga diante da população do Brasil, é um universo expressivo.
Volta e meia testemunhamos alguns autores se vangloriarem por terem vendido
milhares de livros, além de conseguirem traduções e lançamentos no exterior. As
bienais se transformaram em eventos para multidões.
Sim,
temos leitores, porém, são mal direcionados. É como se as editoras alimentassem
um monopólio de autores nacionais: aqueles que mais vendem, os que já
conquistaram fama, são os eleitos para povoarem sozinhos todas as vitrines. Um
erro trágico de estratégia. Ao concentrar o marketing, ao criar um funil
publicitário, os grandes editores empobrecem seus catálogos e ensaiam um tiro
pela culatra.
Por
esses dias, numa novela da TV, uma atriz indicava o livro para o companheiro de
cena. O livro era de um autor carioca que anuncia por aí ter vendido mais de 10
mil exemplares, com traduções no mundo todo. De repente, me toquei que não
vemos propaganda de livros na TV e quando ela acontece já me disseram que se
deve ao fato de ser livro de algum colaborador da emissora. Por que as editoras
não investem nesse meio de divulgação? Por que as TVs abertas não democratizam
o espaço para o merchandising literário e permitem que, pelo menos
uma vez por semana, se divulgue um livro numa novela ou programa de boa
audiência? Para concluir, por que aquele programa sobre literatura da TV a cabo
não avalia de verdade as sugestões de pauta que são enviadas pelos
telespectadores?
A
força dos sonhos
Está na hora do mercado
editorial e das megastores lembrarem que não trabalham somente com
livros contábeis. Dedicar um pouquinho mais dos bilhões que faturam para
incrementar a cultura não vai quebrar ninguém. Infelizmente, observamos que os
maiores grupos editoriais incentivam os feudos literários, concentram-se em
promover um pequeno grupo de nomes. É a lógica invertida de investir em poucos
para ganhar muito, um critério que não considera compartilhar o investimento em
propaganda entre o maior número possível de escritores. Preferem a gestão
feudal do negócio.
Revezar
o lugar em cena seria uma ação nobre para autores como Chico Buarque, Cristovão
Tezza, Rubem Fonseca, Veríssimo e tantos outros que ainda não perceberam que
podem contribuir para criar um número significativo de protagonistas na
realidade da nossa literatura. Isso renderia bons frutos até para quem tomasse
a inciativa de apadrinhar uma nova geração. Porém, nós entendemos a dificuldade
de agir com generosidade e desapego. A fama é usurpadora, é faminta e quer
sempre conquistar mais espaço ao invés de doá-lo aos desabrigados das letras.
O
nosso panorama literário mostra-se como um espelho do país. De um lado temos os
latifundiários dos livros, vendem na casa dos milhares, ocupam os pontos mais
valorizados das redes de livrarias, faturam adiantamentos das editoras, são os
mais requisitados nos congressos e ganham muita grana com os derivados da
atividade cultural. Do outro lado temos os sem-terra da literatura, os
favelados da arte que não encontram editoras que os publiquem, precisam pagar
pela autopublicação, gastam dinheiro para se inscreverem em concursos e
premiações, não conseguem nenhum espaço digno nas livrarias e não são
convidados para participar das grandes festas literárias.
O
Prêmio São Paulo de Literatura alega que ficou com posições abertas em 2015
porque não houve consenso sobre autores dignos da premiação. Sinceramente, soa
como desaforo afirmar, diante do leque enorme de autores publicados em 2014,
que o júri não conseguiu preencher as 30 vagas de finalistas. No entanto, Chico
Buarque e Cristovão Tezza estão lá. Eles merecem, nem questionamos isso. Mas
nesta altura da vida seria a solidariedade, não um prêmio, que justificaria a
reputação que carregam. Como já alertava Sartre: o silêncio é reacionário.
Não
que seja impossível romper a barreira que mantém distante o escritor anônimo da
elite das letras. Não, não é impossível. É quase impossível. Caso me peça um
conselho, eu lhe citarei as palavras sábias de um milionário: “Acredite na
força dos seus sonhos. Deus é justo e não colocaria em seu coração um desejo
impossível de ser realizado” (Paulo Coelho).
Você
está rindo? Ótimo, então captou o espírito da prosa.
***
Alexandre
Coslei é jornalista e escritor
Fonte:
Observatório da Imprensa
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